Jealous Guy


A paixão e o amor andam de rostinhos colados e braços dados com a inveja e o ciúme. Quanto maiores os dois primeiros sentimentos, mais difícil de controlar os dois últimos.

Jogadores de futebol estão para nossa relação de amor com nossos times de coração, como cunhados estão para namoros. Tu até quer gostar daquele cara, mas infelizmente ele faz coisas inomináveis com tua irmãzinha.

Neste verão, dois casos foram notórios para entender o mecanismo de ódio que o torcedor “moderno” nutre por aqueles que deveriam ser ídolos, e acabam transformando-se em parias sociais: Walter e Adriano.

Quem acompanha futebol foi bombardeado por notícias desses dois rapazes de origem humildade, de salários fora da realidade do Zé Povinho e de futuro tão incerto quanto o de qualquer um de nós.

Pro senso comum, Walter é apenas um bom jogador, com problemas de peso, superestimado pela mídia, que ganha abusivos 15 mil reais a cada trinta dias, tendo pouco mais de 18 primaveras somadas na identidade. É considerado burro, ignorante, retirante nordestino que não consegue se enquadrar na normalidade do sul (Minas para baixo), de um trabalhador normal.

Adriano seria uma extensão de Walter, só que com mais de 25 anos, mais talento comprovado e muito mais verdinhas na conta bancária. É visto como um craque desperdiçado por influência de más companhias, falta de comprometimento com a vida de trabalhador do futebol e principalmente pelos Euros, que subiram a sua cabeça. “Tinha tudo pra ser um dos melhores do mundo, mas não adianta…”, alguém já disse isso perto de ti. As reticências silenciosas querem dizer “… mas é FAVELADO e preto”.

Todos estes conceitos são propagados por nós, classe média consumidora do esporte número um do mundo. E o que há por trás destas verdades magnânimas e imutáveis? A mais pura inveja, que nutrimos por estes jovens que ganham dinheiro para chutar bolas pelos gramados do planeta. Se eu treinasse todo dia jogava melhor que eles, alguns dizem. Só fazem isso da vida e ainda reclamam, bradam outros. Pra jogar pelo (insira o clube da sua preferência), jogava até de graça, e ainda assim corria mais que esses desgraçados, insultam milhares.

No fundo dizemos isso pela total incapacidade de estar na posição daqueles que deveriam ter nosso apoio.

Esse sentimento assusta. Pelo simples fato da esmagadora maioria dos jogadores de futebol do Brasil saírem da condição de pobres, iletrados, oprimidos, desfavorecidos de oportunidades melhores na vida, enfim, CRUCIFICADOS PELO SISTEMA, mereceriam nossa mais devota simpatia. Mas não. Eles abandonam nossos clubes ao menor sinal de proposta do exterior, nós enchemos a boca e socamos a mesa do bar. E se te oferecessem pagamento em Euros, pra fazer o mesmo trabalho que tu exerce hoje, agora, aqui no Brasil?

No lugar da empatia, os potenciais ídolos do povo, que poderia vê-los como gente como a gente, recebem julgamentos morais que não impomos a outras pessoas de “nível social” mais elevado.

Vemos jogadores de futebol como ricos enfastiados, que afirmam que chutar uma bola é trabalhar, vejam só! Mas na infância, antes de sonhar em ser bombeiro ou astronauta, o que a gente queria ser mesmo?